sábado, 18 de agosto de 2018

Quando o sol


Temos que ir.
Como se o mundo acabasse
Numa tarde de facas e
Sol que nunca mais finda
A pino.

Oiço as paredes
A cal branca das paredes
e a memória das cigarras em guerra.

A água corre?
Rumorosos regatos recordam-me
Tardes. É assim que cresço
Entre essa lembrança e a dor
De dias. A casa abate-se sobre mim
E sobre o meu desejo cresce um corpo
Que ainda não sei até onde vai.

Se consigo escrever é porque desfaleço
Nas palavras que não consigo dizer.
Odeio as letras que me faltam, porque
Há um excesso. Nas borbulhas do corpo, nas
Minhas mãos. Em tudo o que dói e sangra e
Se recorta da brancura dos lençóis.
Amo e no entanto percorro os dias
Infeliz. Deliciosa tortura esta
Feita de tesouras, musgo e pele.

O teu cheiro eterno persegue-me
Como se fosse uma sentença, uma prisão
Para sempre. Vá para onde for, persegue-me o teu cheiro
E as tuas mãos, e o teu olhar de mar
E outras coisas que eu sei que aparecerão sempre
Por mais que fuja e me afaste.

És assim a mais terrível emboscada.
Terrível, até quando te ris.

E é pela tua calma indizível
Que vai caindo a tarde e
o Sol esmorece
Cansado.

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