Irving Kristol (1920-2009). Este americano, apesar de conhecido
jornalista, enquanto um dos editores do Wall
Street Journal, acabou por ficar conhecido como um dos fundadores do
neoconservadorismo. Ficou conhecida a seu descrição de um neoconservador: um
liberal que foi assaltado pela realidade. Descrevia, assim, uma eventual
evolução de alguns intelectuais liberais e de esquerda que teriam guinado à
direita, depois de constatarem a improbabilidade das suas ideias, a deceção das
experiências liberais e a dura e triste realidade, negando todas as ilusões
pueris. Aliás, o próprio percurso de Kristol ilustra esse mesmo processo: do
radicalismo socialista e do trotskismo da juventude, "evoluiu" até ao
mais radical anticomunismo. Um percurso que também encontramos entre nós, de
forma abundante e bem esclarecedora. Entre nós, publicou-se a sua obra de
referência: Neoconservadorismo -
autobiografia de uma ideia[1],
e que reúne vários artigos.
Ora, por ter tido necessidade de preparar umas aulas sobre o
multiculturalismo, acabei por regressar
a este livro de Irving Kristol, detendo-me, precisamente, num dos seus
artigos de 1991 intitulado «A tragédia do multiculturalismo»[2].
Neste curto artigo, Kristol reflete sobre o multiculturalismo no âmbito
da educação. É assim que o define como o esforço excessivo levado a cabo por
alguns educadores no sentido de alargar o currículo convencional de forma a
confessar as minorias étnicas, nomeadamente, os jovens negros, como
"estratégia desesperada - e condenada à nascença - para fazer face às
[suas] deficiências educacionais [...] e às patologias a eles associadas"[3].
Esta estratégia também contemplaria outros grupos minoritários de origem
hispânica e oriental. Embora, considera Kristol o processo de americanização ´o
objetivo central dos progenitores, pelo que não manifestariam preocupações de
natureza multicultural. Esse processo de integração, constata Kristol, que não
tem funcionado tão bem para os negros americanos conduz ao "desespero que
fez com que nos voltássemos para o multiculturalismo"[4]
e a procura de instrumentos e estratégias que ampliem o currículo. Só que,
afirma Kristol, os problemas dos jovens negros eram um produto do lar e do
ambiente e não um problema de educação.
No entanto, Kristol denuncia o multiculturalismo enquanto problema
nacional e a sua propagação através duma "coligação de
nacionalistas-racistas negros, feministas radicais, gays, lésbicas e um punhado
de demagogos potenciais que se dizem representantes de várias minorias
étnicas"[5]. E
conclui que o multiculturalismo desta coligação é "uma ideologia cujo
programa educativo é, acima de tudo, anti-americano e anti-ocidental".
Ora, é aqui que se revela o quiprocuó
do nosso neoconservador em relação ao multiculturalismo: é que esta ideologia
radical insere-se na guerra contra o Ocidente e contra a América,
infiltrando-se no sistema educativo! O multiculturalismo, segundo Kristol,
revelaria uma ofensiva contra os valores da América e do Ocidente, uma ofensiva
ideológica debaixo de uma narrativa eivada de preocupações pedagógicas. [a continuar]
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