Aqui se acoitam mentes brilhantes, almas torturadas e um pobre professor de Filosofia
quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017
O que vale a filosofia?
Não existe acordo sobre o que é a Filosofia e o seu valor. As várias concepções sobre o que é a Filosofia deviam-nos levar a falar desta no plural: em vez de Filosofia, devíamos falar de filosofias. A Filosofia vai variando de época para época na medida em que tenta responder aos problemas que são postos nessa mesma época. Como as suas respostas nunca são definitivas nem podem ser sujeitas à comprovação experimental, há problemas que são eternos. Ou perto disso, para não tirar o lugar aos diamantes. Fica-se com a ideia e com a impressão de que a Filosofia nada vale. Ao contrário do que se passa nas Ciências em que existe acordo (ou qualquer coisa perto disso) em relação às respostas que fornece e, portanto, progresso no conhecimento. Um . progresso não linear, entenda-se. . Nós discutimos problemas filosóficos que os gregos já colocavam, mas, a matemática de hoje já foi mais longe do que as conclusões de Pitágoras. Apesar disso, as questões da Filosofia dizem respeito à condição humana e interpelam o Homem no seu íntimo. Podemos dizer, face a isso, que a Filosofia não vale nada? E se não valesse nada? Não poderia ser esse o seu maior valor?
terça-feira, 21 de fevereiro de 2017
Valores e cultura – apontamentos
Valores e cultura
«Os valores são criação
do próprio ser humano, manifestações da sua natureza cultura. E é através do processo
de socialização que vamos assimilando ps valores que sustentam as nossas
atitudes e acções.»
A cultura
(segundo Anthony Giddens (2004), Sociologia, Lisboa, FC Gulbenkian, pp. 46-47)
“A cultura consiste nos
valores de um dado grupo de pessoas, nas normas que seguem e nos bens materiais
que criam. (…) Quando usamos o termo, na conversa quotidiana comum, pensamos
muitas vezes na «cultura» como equivalente às «coisas mais elevadas do
espírito» - arte, literatura, música e pintura. Os sociólogos incluem no
conceito estas actividades, mas também muito mais. A cultura refere-se aos
modos de vida dos membros de uma sociedade, ou de grupos dessa sociedade.
Inclui a forma como se vestem, os costumes do casamento e de vida familiar, as
formas de trabalho, as cerimónias religiosas e as ocupações dos tempos livres.
Abrange também os bens que criam e que se tornam portadores de sentido para
eles – arcos e flechas, arados, fábricas e máquinas, computadores, livros,
habitações.”
Ao reconhecermos a
pluralidade e diversidades de culturas, acabamos por afirmar também a
diversidade dos valores que estruturam a vida dos indivíduos integrados em
vários grupos e comunidades.
pluralidade e diversidade
culturas → pluralidade e diversidade de valores
O que é a cultura
(segundo Edvino A. Rabuske, Antropologia Filosófica)
a) A cultura é um fenómeno universal;
cultura / natureza
b) A cultura é produção de novos
objectos e produto (a partir da cultura passada)
c) O homem é sujeito e objecto da
cultura – produto e produtor da cultura
d) A cultura é uma estrutura, um
conjunto de elementos interdependentes (religião, economia, arte, etc.)
e) A cultura tem sempre um centro (um
conjunto de princípios que orientam e objetivos que impulsionam → isto une e
identifica cada cultura especificamente)
f) A diversidade de culturas é um facto
do passado e do presente
Formas diferentes de encarar a cultura
Etnocentrismo
Uma visão centrada ou
egocêntrica de uma cultura em relação às outras; avalia as outras culturas a
partir de si próprio, dos seus valores e padrões de comportamento.
Relativismo
Aceita e respeita a
diversidade cultural; cada cultura só pode ser avaliada a partir de dentro,
isto é, dos seus valores, ideias e padrões de comportamento.
O etnocentrismo promove a assimilação
As culturas dominantes
tendem a impor os seus valores e modelos de comportamento às culturas
minoritárias. Possíveis consequências: racismo, xenofobia, patriotismo ou
nacionalismo exacerbados
O relativismo promove a separação
Há diferentes culturas
que se toleram, mas que vivem de costas voltadas, sem contacto entre si e que
tendem a separar-se ou a isolar-se. Possíveis consequências., podem ocorrer
fenómenos de segregação, de que a guetização é um exemplo.
Crítica ao relativismo – limites e limitações do relativismo
terça-feira, 14 de fevereiro de 2017
Valores e valoração – a questão dos critérios valorativos
A experiência valorativa - Agir em função dos valores
Toda a ação executa uma
valoração: no processo de deliberação que culmina na decisão exprimo e realizo
preferências. A minha ação concretiza as minhas opções e valorações, o que eu prefiro
e o que eu afasto das minhas possibilidades.
As opções que faço
dependem duma hierarquia de valores que possuo e que me foi transmitida pela sociedade
em que vivo, nomeadamente através da educação que recebi da minha família e
experienciei na escola e nos demais processos de socialização, através dos amigos
ou dos meios de comunicação de massas.
Hierarquização dos valores
A valorização e a
hierarquização é subjetiva, depende da minha subjetividade, depende de quem eu sou.
Não existe uma ordenação objetiva, universal, absoluta. A minha hierarquia de
valores ou da comunidade exprime-se através numa tábua de valores, onde os
valores se inscrevem e assinalo os mais importantes (para mim ou para a minha
comunidade ou grupo) e os menos importantes.
Tábua de valores segundo Max Scheler
Existe uma grande variedade
de valores. A título de exemplo, apresenta-se esta lista de vários tipos de valores
segundo o filósofo alemão Max Scheler (1874-1928)[1]:
- valores religiosos:
santo/profano; divino/demoníaco; supremo/derivado
- valores éticos ou
morais: bom/mau; justo/injusto; leal/desleal
- valores estéticos:
belo/feio; sublime/ridículo; harmonioso/desarmonioso
- valores lógicos:
verdadeiro/falso; evidente/provável
- valores vitais:
forte/fraco; enérgico/inerte
- valores úteis:
caro/barato; abundante/escasso
Valores e valoração
Consideram-se quatro
elementos fundamentais:
- objeto dos valores:
bens, situações, comportamentos
- sujeito: aquele que
procede às valorações, sujeito individual ou coletivo
- valoração / valorar:
atribuição do valor ao objeto[2].
Características dos valores
Consideram-se entre
várias, as seguintes características:
- polaridade
- diversidade
- subjectividade
- historicidade
- hierarquia
Juízos de facto e juízos de valor
O que pensamos, sentimos
ou preferimos, exprime-se através de juízos e proposições.
Os juízos de facto
descrevem a realidade e tendem a ser objectivos.
Os juízos de valores são
proposições que avaliam a realidade, exprimindo as preferências do sujeito.
Estes juízos não são empiricamente verificáveis, não são falsos nem
verdadeiros. Muitas vezes não são consensuais.
Os critérios valorativos
«Diferentes sujeitos
constroem as suas tábuas ou escalas de valores em função das suas experiências
e do significado que lhes atribuem. Tal significa que existem critérios
valorativos diferentes de sujeito para sujeito, de cultura para cultura.»
Exemplo:
Perante os objetos duma
casa ou os seus diferentes espaços, cada um faz as suas escolhas que são
diferentes de sujeito para sujeito.
Ou então, observemos
vários comportamentos dos consumidores ao fazerem compras num supermercado… As compras que cada um faz, concretiza as suas preferências, exprime a sua tábua de valores.
[2] Valorar não é o mesmo que valorizar. Valorar é atribuir um valor,
positivo ou negativo. Valorizar significa atribuir mais valor ao objecto, que
assim é valorizado, passa a valer mais. Por exemplo, ao pintar uma casa estou a
valorizar o edifício que passa a valer mais numa venda.
A primeira aula de Filosofia - páginas dum diário dum aluno
Tive hoje a primeira aula de Filosofia. O professor era mais gordo do que eu estava à espera. E também mais velho, já tinha muitos cabelos brancos. Bem, eram mais os brancos que os outros. Mas tinha o cabelo bem assente, não estava despenteado, devia ser das ideias filosóficas. Sempre pensei que um homem dedicado ao saber e à reflexão deveria ser magro, com os ossos a quererem romper a pele, com olheiras à volta dos olhos encovados, usando uma gabardina sebosa apesar de não estar dia de chuva, e umas peúgas de cada cor. Era assim que imaginava o stor de Filosofia a partir do que me tinham dito os colegas mais velhos. Ora, eu estava profundamente enganado. Nem sempre o que imaginamos se realiza. Se eu encontrasse o meu novo professor de Filosofia atrás dum balcão duma mercearia, a vender açúcar e massa, ou na caixa de um supermercado, teria achado perfeitamente normal. Afinal, era a pessoa mais comum que podia haver! Mas não era nenhuma desilusão, de modo nenhum!...
Talvez fosse isso, ser tão igual aos outros, que fizesse dele um tipo diferente. Quando nós procuramos ser diferentes uns dos outros, originais a vestir por exemplo, acabamos por nos tornarmos iguais aos nossos amigos e colegas. Este profe era tão sem graça, sem nada de especial, no físico ou no aspeto, que devo reconhecer que era diferente dos outros. Era como se quisesse ser invisível, passar invisível. Por isso é que se ouvia tão bem a sua voz...
(Do texto em desenvolvimento, Borbulh@s e Heraclito - diário de um estudante de Filosofia)
Talvez fosse isso, ser tão igual aos outros, que fizesse dele um tipo diferente. Quando nós procuramos ser diferentes uns dos outros, originais a vestir por exemplo, acabamos por nos tornarmos iguais aos nossos amigos e colegas. Este profe era tão sem graça, sem nada de especial, no físico ou no aspeto, que devo reconhecer que era diferente dos outros. Era como se quisesse ser invisível, passar invisível. Por isso é que se ouvia tão bem a sua voz...
(Do texto em desenvolvimento, Borbulh@s e Heraclito - diário de um estudante de Filosofia)
sábado, 11 de fevereiro de 2017
Sumários desenvolvidos de Filosofia 10º ano - 2016/2017
Para aqueles que pretendem seguir os "Sumários desenvolvidos" na edição mais recente, aqui está o texto...
Apresentação
Inicia-se hoje este blogue de apoio às aulas de Filosofia, neste meu regresso ao ensino ao fim de quatro anos no departamento jurídico do Ministério da Educação. Trata-se, num primeiro momento, de um espaço de partilha de textos e informação que os meus alunos, nomeadamente, poderão utilizar. Mas deverá também constituir um local onde irei colocar as minhas reflexões e aquelas que, produzidas pelos meus alunos, se entenderem pertinentes e ajustadas. Finalmente, deverá ser, também, um repositório de sugestões de leituras e locais a visitar, nem sempre a pensar nas aulas, indo para além das aulas de Filosofia e do seu programa. Este ano, por motivos da minha lecionação no presente ano letivo, incidir-se-á nos conteúdos do programa de Filosofia do 10º ano. Fico, contudo, atento e disponível para acolher todos os contributos e sugestões. E, claro, acoitar mentes brilhantes e almas torturadas. O vosso pobre professor de Filosofia já cá está...
Poderia a Filosofia não ser grega?
Interrogo-me sobre o início. Nada melhor que a começar essa interrogação. É que existe um início da Filosofia, um lugar e um momento. Para o Ocidente, vale a Grécia, a Antiguidade grega. Ao que parece a Grécia possuía o território indicado para o início da Filosofia: uma extensa linha de costa, um território luminoso aberto ao mar, solicitado por essa impermanência constante, feita de água que vai e vem, que surge e se dissolve, que nos apela para lá de si mesmo. A Grécia era, pois, o melhor lugar. Um território solar é propício a ideias luminosas. Mas não havia melhor? Talvez, mas quando os Gregos apareceram a pensar a coisa filosófica, logo trataram de considerar os outros no fundo de uma caverna, eternamente iludidos com as sombras que eternamente os visitavam, como um pesadelo agarrado à pele. Os filósofos dispõem dessa especialidade capciosa muito próxima das habilidades dos políticos: quem não é filósofo é contra a filosofia; quem não habita a verdade, anda perdido a vaguear nas ruas da ilusão ou permanecerá preso aos seus preconceitos. Parece, pois, que a Filosofia não podia surgir noutro sítio. Se despontasse noutra pátria, era mais um subproduto das tolices e das paixões humanas. Poderia nascer noutro sítio, mas não era a Filosofia.
Subscrever:
Mensagens (Atom)