Falar, como o olhar, visa o poder. Falamos e olhamos para
dominar o outro. Porém, o falar
tem um problema: o falar excessivo torna o
discurso numa forma de elementar tagarelice. Entramos no domínio do que os
franceses chamam "bavardage".
Não sei muito bem porquê, mas "bavardage" soa-me a
javardice. O javardo é também um tagarela, alguém que não consegue parar de
falar, de dizer banalidades, baboseiras. Fala tanto, que não consegue fechar a
boca enquanto come. Javardice.
Não pára de falar porque fica incomodado, visivelmente
incomodado, com o silêncio. Quando o silêncio se instala, o tagarela fica
aflito, incomodado, não sabe o que há-de fazer com as mãos, onde pôr as mãos.
À mesa, pega na sardinha com as mãos e leva-a à boca. Faz o
mesmo com a perna do frango assado. Desculpa-se, dizendo que é assim que a
comida (o "comer") lhe sabe melhor. Quer ser autêntico, puro,
dispensa os talheres e as regras mais elementares. Que não alinha em "modernices".
Javardice. Javardice pós-moderna.
Hoje, parece haver uma enorme contradição no estar. Não estamos em silêncio porque o silêncio, na sua imensa grandiosidade, afronta-nos. Mas se calhar também já perdemos muita da nossa capacidade para estar com o outro e com ele comunicar de forma direta. Olhos nos olhos, dir-se-ia. Com a nossa comunicação fortemente mediada pelas tecnologias, o telemóvel é a perna do frango com que javardamente ocupamos as mãos e com que falamos de boca cheia sem chegar sequer a abri-la. E assim se vai perdendo a riqueza do contacto humano.
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